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O momento UBER

27 Outubro 2016

Ninguém ficou indiferente à luta dos Taxis, seja por ter ficado preso no trânsito, seja por alguns motoristas Uber não circularem nas zonas “de protesto”,  ou simplesmente por ser utilizador de redes sociais ou espectador de telejornais. Mas qual é afinal a luta dos taxistas?

Os meios de comunicação social divulgaram ao minuto os acontecimentos, as emoções e as motivações. A sociedade dividiu-se em aprovações e reprovações, solidariedade e julgamentos, palmas e apupos, tal derby futebolístico, de um lado os simpatizantes da Uber do outro os do Táxi. Confesso, que tenho dificuldade em simpatizar com um serviço de má reputação, conhecido pela fraca orientação para o cliente, falta de honestidade para com os turistas e outros cidadãos incautos, praguejamentos e resmungos para com clientes que ousam viver próximos do aeroporto, serviço pouco profissional, veículos de mau odor e mau estado e patrões mercenários sobre os quais podemos ouvir com facilidade através dos motoristas. Há exceções, claro. Há sempre exceções. Mas falamos da reputação coletiva e não das pessoas.

Ainda assim, desafio a minha capacidade empática e saio do lugar do passageiro, rendido à maior eficiência, conveniência e profissionalismo da Uber, para me sentar no lugar “do taxista”. O seu mundo está a mudar. Da mesma forma que mudou o mundo das editoras de música, dos jornais, dos bancos, da hotelaria, das agências de viagens, dos vendedores e de muitos outros setores que foram devastados pela internet, pelas apps móveis e pela capacidade das pessoas terem acesso a informação gratuita que antes costumavam pagar. Os lucros caíram e as industrias tradicionais agonizaram para encontrar novos modelos de negócio.

 A “uberização do trabalho” chegará a todos os sectores de atividade.

Nos Estados Unidos, em vez de irem para a fila do centro de saúde marcar a consulta e de se sentarem numa sala à espera da sua vez, os pacientes podem usar um website ou uma app mobile para pedir uma consulta on line a uma pool de médicos inscritos na plataforma American Well, uma das dezenas de empresas de telemedicina que têm vindo a proliferar nos Estados Unidos e no resto do mundo . Quando o paciente faz o pedido é emparelhado com um médico do seu estado e da especialidade adequada e o primeiro médico a responder ao pedido fica com a consulta. O tempo médio de espera dos pacientes é de 3 minutos e o custo é inferior à opção “sistema convencional”, o que faz com que seja utilizado por muitos utentes que não conseguem pagar um seguro de saúde nos Estados Unidos.

Até o sector Legal, talvez o mais tradicional e anacrónico de todos os sectores, vê chegar o seu momento Uber . A Axiom, com sede em S. Francisco junta uma rede de 1500 advogados de várias áreas de especialidade que trabalham desde casa ou dos seus escritórios pessoais, e oferecem os seus serviços jurídicos através desta plataforma. Os custos tornaram-se mais suportáveis para o cliente final e mais de metade das Fortune 100 já está na lista de clientes da AXIOM.

Estima-se que em menos de 10 anos 40% dos trabalhadores nos EUA estarão num regime de trabalho “tipo Uber”, isto é, oferecendo serviços de forma independente através de uma plataforma digital. O emprego corporativo de longo termo está a dar lugar ao paradigma de “trabalho a pedido” (work on demand) muitas vezes descrito como modelo Uber ou Uberização.

Voltando à perspectiva do condutor de táxi, é fácil compreender o sentimento de insegurança, o medo de um futuro que se tornou mais complexo e imprevisível, a desconfiança em relação a novos modelos de negócio, e o apelo ao estado protetor. Exigimos proteção contra a economia “Virtual” – poderia ser o mote dos taxistas.

Como sempre acontece nos processo de mudança, onde alguns vêm ameaça, outros vêm oportunidade. Os donos da 99Taxis, uma popular aplicação o de táxis do Brasil, não viram no confronto com a Uber a melhor resposta. Em vez disso, decidiram perguntar-se porque é que os clientes estavam a preferir a Uber e decidiram melhorar a aplicação e o serviço prestado para enfrentar a concorrência. Aparentemente resultou. Enquanto em 2015 foi um ano difícil para muitos negócios no Brasil, a 99Taxis registou um crescimento de 10 a 15% ao mês no número de corridas. O número de taxistas a aderir à aplicação também aumentou. Hoje tem 150.000 taxistas registados e ganha cerca de 100 novos motoristas registados por dia. As projeções para 2016 são ainda melhores.

Assim, volto ao lugar do passageiro, desta vez para desafiar o motorista de táxi: – O que acha de trabalhar para a Uber ? Porque não? Imagine que é um dos motoristas com melhor avaliação pelos clientes. Imagine que consegue ganhar mais do que aquilo que o seu patrão lhe paga atualmente, talvez até já esteja a recibos verdes, diz-se que 50% dos taxistas estão. Imagine que usa a geo-referenciação para saber onde estão os seus clientes e o estado do trânsito e que não tem que fazer pagamentos, nem trocos, nem faturas, nem esperar pelo cliente que foi ao multibanco levantar dinheiro. Imagine que os colegas desonestos, indelicados e desleixados que dão mau nome à profissão, deixam de estar no mercado, porque a avaliação que recebem dos clientes é negativa e não podem continuar a prestar serviço. Imagine, que deixava de ter que cumprir um horário fixo, que passa a ser dono do seu tempo, que se lhe apetecer não trabalhar no seu aniversário, ou se quiser ir à reunião de pais do seu filho, ou ao jogo de futebol do seu clube, não tem que pedir dispensa ao patrão. O Sr. queria ser Uber?Ou então, veja desta forma. Não deveria o Sr. taxista estar a lutar para que o seu patrão ou a sua associação profissional torne o negócio mais eficiente, utilizando ferramentas digitais que lhe permitam reduzir os tempos mortos, ter meios de pagamento automáticos, estar mais informado sobre o fluxo de trânsito, ser mais eficiente, mais competitivo e quem sabe trabalhar menos horas e ter mais flexibilidade na sua vida? Não deveriam, o Sr. taxista e todos nós, lutar por sistemas de educação e formação capazes de nos dotar do conhecimento, das competências e do mindset necessários para nos adaptarmos à (r)evolução tecnológica e às mudanças do mercado de trabalho? E por sistemas de proteção social capazes proteger outros profissionais que não apenas os do “emprego convencional dito não precário”?

Ou devemos continuar a lutar pelo “bom emprego” ancorados na crença ilusória de que a vocação das empresas é a criação de postos de trabalho, quando tudo aponta para a constatação de que a criação de valor para os acionistas e criação de “bons empregos” são amplamente incompatíveis. Como refere Jerry Davis da Universidade de Michigan – “as empresas só são criadoras de emprego quando não têm alternativa”, e as alternativas são cada vez mais.

 

Sandra Pires

Partner at unexpected

MADRID, SPAIN - OCTOBER 14: In this photo illustration the new smart phone taxi app 'Uber' shows how to select a pick up location next to a taxi lane on October 14, 2014 in Madrid, Spain. 'Uber' application started to operate in Madrid last September despite Taxi drivers claim it is an illegal activity and its drivers currently operate without a license. 'Uber' is an American based company which is quickly expanding to some of the main cities from around the world. (Photo by Pablo Blazquez Dominguez/Getty Images)

(Photo by Pablo Blazquez Dominguez/Getty Images)

 

 

About the Author

Sandra Pires

Sandra is partner of unexpected since 2012 and she is mainly the curator for unexpected transformational programs and collaborates with The Mind Gym, MPI and IDG group for international projects. After 10 years working in consultancy projects across Portugal in organizational development, instructional design, training, b-learning, experiential learning and coaching, she decided to try “the other side” and accepted a position as HR manager of an automotive Iberian Company. During 6 years she was responsible for HR policies and programs in articulation with business strategy, in order to promote Talent Attraction, Development and Retention to the commercial network in Portugal, Spain and Angola. After this “double side” experience, Sandra felt she was ready to return to consultancy (“the best possible sector for compulsive learners”) and run her own company. With an Academic background in Organizational Psychology, Sandra has made post graduated studies in Emotional Intelligence, Stress and Well Being, and Cognitive-Behavioural intervention models. She is frequently invited to participate in MBA programs as invited teacher.